segunda-feira, 8 de agosto de 2011

MEU QUERIDO SANTO ANTÔNIO

   Em todos os lugares dessa terra cheia de fé, as moças casadoiras faziam de tudo para arrumar marido: de promessas a torturas de santo. O preferido era Santo Antônio.


   Na noite de treze de junho, elas deixavam uma bacia cheia d´água ao relento, pois acreditavam que poderiam ver o rosto do futuro marido no reflexo.


   E se não tivesse nada lá? Era um tal de amarrar o santinho de cabeça pra baixo ou colocar o pobre no poço, até aparecer um pretendente.


   E as orações então? Tinha uma que era:


   “Meu Santo Antônio querido
   Eu vos peço por quem sois
   Dai-me o primeiro marido
   Que o outro arranjo depois.”


   Tinha outra para os casos mais graves:


  “Meu Santo Antônio querido
   Meu santo de carne e osso
   Se tu não me dá marido
   Não tiro você do poço!”





   Maria Helena, a Leninha bordadeira, sempre fazia uma simpatia para casar.


   Teve um ano em que a Leninha colocou um pouco de cinzas nas mãos. Rezou pro Santo Antônio e abriu as mãos para ver a inicial do nome do seu amado. Que letra era aquela? T? Ou seria M?


   Passou um ano, mais um dia de Santo Antônio chegou e a moça fez várias simpatias, só para garantir.


   “Desta vez tem que dar certo.”


   Leninha fez a da bacia, a da maçã amarrada com dois coraçõezinhos, a da clara de ovo num copo com água, a do punhal na bananeira e a da fitinha.


   Antes de dormir, ainda colocou três feijões embaixo do travesseiro:  um feijão com casca, um com alguma casca e outro sem casca nenhuma. Essa simpatia era para saber se o seu marido ia ser rico, remediado ou pobre.


   Quando amanheceu, quanta esperança!


   Leninha foi logo conferir e lá veio o feijão pelado.


   - Ora Santo Antônio, um pobretão pra mim? Vá lá, contanto que venha!


   A moça olhou o copo com a clara de ovo e coçou a cabeça.


   - Hum... letra B? Ou será D? H?


   Depois foi ver a bacia. Fechou os olhos, respirou fundo e olhou.
Não apareceu nada.


   Respirou fundo mais uma vez e nadica de rosto do futuro marido.


   “Água? De certo meu esposo vai ser marinheiro!”


   Leninha tirou o punhal da bananeira e olhou a letra.


   “Seria um R? Também pode ser um U...”


   A moça estava desacorçoada.


   - Ai Santo Antônio, chega! Eu já tenho vinte anos e nada de marido. Já me enamorei do Zé carteiro, do Dito leiteiro, do Denão que toca na banda, o Maneco da venda e qual? Cadê o homem? Eu bordei tanto enxoval que meus dedos têm até calo!


   Antes de sair pra missa, arrematou:


   - Perdi a paciência com o senhor, santinho! Vou tomar esse Menino Jesus dos seus braços e só devolvo quando me aparecer
um príncipe!


   O tempo passou e eis que surgiu por aqui um violeiro. Seu nome era Leôncio, um tocador de primeira, desses que têm até guizo de cascavel na viola.


   Leninha e o violeiro se viram pela primeira vez na festa da padroeira. Daí em diante, foi um tal de Leninha suspirar daqui e o Leôncio suspirar de lá.


   Até que um dia, o violeiro colheu uma rosa vermelha e foi tocar embaixo da janela da moça.


   Marcaram o casamento.


   Leninha, já de bem com Santo Antônio, escolheu se casar bem no dia dele, treze de junho. Andava que era só elogios pro santinho e sorrisos pro violeiro.


   Na véspera do grande dia, a noiva foi dar a última conferida no vestido branquinho, antes de dormir. De repente, começou a escutar um zunzunzum vindo da rua.


   Os barulhos foram aumentando e virou um chororô alto, sem fim.


   Foi um deus-nos-acuda: o Zé, o Dito, o Denão e o Maneco chorando que nem bezerros desmamados embaixo da janela da Leninha.


   Até o pai da noiva teve que intervir, pegou a espingarda e botou todo mundo pra correr.


   A Leninha, com os olhos cheios d’água, pediu mil perdões pro Santo Antônio e quase não dormiu.


   No dia seguinte, foi casar de olhinhos inchados mesmo.


   O pai da moça, pelo sim pelo não, rumou pro casamento com a garrucha na cintura, pra evitar qualquer bagunça no enlace.


   O casamento aconteceu e o casal viveu feliz para sempre.


   A Leninha virou a devota mais fervorosa do Santo Antônio e nunca mais judiou dele.


   Todo ano, no dia treze de junho, Leninha e Leôncio faziam uma festa pro santinho, com fogueira e muita comida.


   O Leôncio tocava viola e contava suas histórias do tempo de tropeiro.


   A Leninha ensinava as simpatias pras moças e virou a madrinha de casamento mais concorrida de Jacareí.

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